Afinal o que importa não é a literatura nem a crítica de arte nem a câmara escura
Afinal o que
importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio
Afinal o que
importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante
Afinal o que
importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
Não
é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola
Que afinal
o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come
Que afinal
o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!
Que afinal
o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora!
– rir de tudo
No riso admirável
de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra
Mario Cesariny
Um dia não tinha nada em que pensar e perguntei: porquê? Logo me responderam, controversos e irritantes: Porque não?
Que maldição! Será possível que não exista solução para o meu problema? Passo a contar-vos a razão da minha pergunta. Quando temos dúvidas e queremos alcançar o silenciado verso da questão perguntamos ao mundo "porquê?"
Ora, o que conta é mesmo a pergunta. A reflexão e a disponibilidade de, sozinhos, numa varanda sem luz a ouvir o vento roçar nas folhas da árvore, vaguear na indeterminada vontade de não saber a resposta. Assim que ela aparece deixa de ser importante. Falta de forças e de desejos de continuar invadem a alma serena. Ah, se um pensamento mais persuasivo me ocupasse a vida como a pergunta me ocupa o momento, era eu alma contente e completa. Mas, sem razão aparente, sou eu mais um porquê milagroso que se pergunta e remove ânsias de dúvidas que navegam em caixões de madeira gasta. Sim, meus caros, morro de medo e tédio que a solidão da questão me torne obssessiva ao ponto de perguntar: porquê? Sim, porquê esta tamanha necessidade de ler nas entrelinhas de uns lábios selados a ouro?
Se retomar, algum dia, a tal varanda nefasta, acudam-me. Perdi o discernimento e já me questionei sobre a vida, sobre vocês e sobre mim. Sobre o ser Humano, sobre o ser Animal. Sobre o ser vida. E aí desmaiei, sem forças para responder: Porque sim.
Caty.
Se levemente me tocasses os olhos. Se sorrisses qual alegria fascinante. Se, ao menos, eu pudesse subir a já antiga escadaria de mármore talvez, sim talvez, eu encontrasse paz.
Mas, num decifrar que não perdura, eu crio marcas na areia. Suspiro, perdendo o repentino ataque de alegria. Esse, voando na minha frente, aproxima-se das estrelas e revela-se inútil aos meus passos. Deixo-me cair, sem réstia de força, na areia branca. Marco presença entre as pegadas de desconhecidos. Pergunto-lhes o nome e eles respondem olhares de ternura como se eu fosse deles. E retiro-me. Para mais tarde me apoderar do longo areal que me espera.
Caty.
al berto. poesia. prosa. desabafos.
anna karenina. desabafos. literatura. ci
ego. grito. coragem. desabafo.
mudança. desabafos. ego. coragem.
revolução. desabafos. grito. silêncio.
silêncio. ego. paisagem. lá fora.